sexta-feira, 21 de outubro de 2011

Aquele 13 de fevereiro de 2011...


O relógio marcava 17 horas daquele domingo de tempo instável, a caminho do hospital eu tinha certeza de que ela estaria melhor... Ao passar pela recepção do hospital e ouvir o segurança falar que ela tinha melhorado eu subir feliz, minha felicidade duraria pouco, e logo daria lugar a maior dor que um ser pode sentir...

Antes mesmo de eu terminar de subir a rampa já ouvia uma enfermeira perguntar quem era a família da dona Maria Aparecida, dei um grito abafado para que ela me notasse.

Ela nós chamou primeiro - eu e o meu Tio Darlan, que tinha sido de Uberlândia/MG até Anápolis/GO para vê-la, estranhei. Estranhei mais ainda quando ela não me deu álcool em gel... Mandou sentarmos, fizemos. Logo veio aquele homem de branco, perguntou meu nome e o que Ela era minha. Minha MÃE respondi com a certeza de que ela tinha melhorado. Ao começar a falar ele era confuso, nada parecia fazer sentido até que ele jogou para fora um “ela teve complicações ao meio dia e faleceu.” Como? Eu tinha entendido errado, tinha certeza, o choro eu não consegui conter, mas por que aquele homem de branco mentia pra mim daquele jeito? Esperei uma risada e um “brincadeirinha”, enfim ao perceber que ele não ria, corri, mas não encontrava a porta, ia de um lado ao outro gritando.... Enfim encontrei rampa e comecei a descer, mas ela parecia não ter fim, se aquilo era verdade, eu tinha que culpar alguém, olhava em volta e ninguém parecia culpado... Então eu me lembrei de Deus, é aquele Deus que me deu um monte de sinais e profecias falsas.... Havia encontrado um culpado, mas ao contrário do que eu havia imaginado, isso não me fez sentir melhor em nada... A rampa não tinha fim, e ao me lembrar do que eu encontraria, torci para que ela realmente não tivesse...

Ao chegar no final eu encontrei a Milianny ajoelhada olhando para cima e pedindo a avó, como eu podia deixar aquele serzinho sofrer sozinha?... Ao olhar pro lado vir meu pai espantado, não triste, ele ainda não havia entendido, em meio ao meu choro eu gritei “ ela morreu” e ele começou a passar mal...

Eu me lembrava da ultima vez que a vi... ela estava lá naquela cama de UTI, lutando, mesmo em coma, era só olhar pra ela você tinha certeza de que ela queria viver, mesmo entubada, cheia de sangue no rosto, aliás aquela cena nunca mais saiu da minha cabeça... Eu olhava para o Marcos, esperando ouvir um “ela é forte, vai ficar bem”, mas acho que ele também queria ouvir isso... O olhar dele era vago, fingia não estar abalado, aliás acho que isso ele aprendeu com Ela, pois ela sofreu muito durante toda a internação, mas nem por um segundo se queixou, sempre que perguntávamos se ela estava bem, ela dizia que sim, que ia ficar boa, era só sairmos para ela chorar, de dor, de medo... Uma vez eu esqueci uma bolsa, e ao voltar ela chorava, perguntei por que, ela disse que se ela morresse as crianças da escola iriam sentir sua falta, eu respondi para ela parar de bobeira, que logo ela estaria de volta para a alegria deles. Em outra ocasião ela chorava e dizia que eu tinha que ir embora cuidar da Milianny pois ela deveria estar sentindo minha falta.... Ela se preocupava com todos, menos com ela... Na Sexta-feira dia 11 o Max iria embora, ela já estava bem fraca, mas ficou mais de 2 horas sentada, descascou e comeu uma laranja sozinha, só para o Max ir embora feliz... Que vontade que eu tenho de ser pelo menos um porcento do que ela foi, eu pensava.

Entrei no carro, numa súbita volta a realidade, enquanto meu pai tentava falar com o Marcos, lembrei que eu tinha que avisar o Max, o telefone chamava, ele atendeu, “a mãe morreu” foram as palavras secas que saltaram da minha boca. Esperava ouvir gritos e choros do outro lado, mas numa voz calma ele respondeu “ela tá melhor agora, tá com Deus, você não queria que ela continuasse sofrendo, não é?” eu só chorava. Ele não a amava? Eu pensava, até que percebi que o que ele acabava de fazer foi na intenção de me proteger, acredito que ao desligar o celular ele entrou em desespero, assim como eu. Enquanto meu pai falava com o Marcos eu pensava o quanto iria ser difícil para ele, receber essa noticia e ainda por cima sozinho, em um estado distante, tremi. A Liliane estava sendo confortada pela tia Nida, a sempre durona que quase não aguentou essa barra... a minha vontade era de proteger meus irmãos, de abraça-los e dizer que tudo iria ficar bem, mas como? Eu não tinha forças para ficar em pé – literalmente.

Na volta para formosa, a cada vez que o celular tocava eu acreditava - de verdade - que era alguém para desmentir aquele homem de branco, mas nada.... Lembrei-me de algo que ela sempre falava, que queria ser enterrada em um caixão bom, pois ela tinha medo de cair enquanto a carregavam para o cemitério, liguei para a Nida, que já tinha resolvido tudo com a ajuda do pastor Romilson...

Minha vontade era de morrer, junto com ela, ali me jogar na frente de uma carreta, me entupir de comprimido... Ele não podia ter me tirado ela, foi a mesma coisa de tirar tudo o que eu tinha, me deixou sem nada, quantas vezes eu pedi para ele tirar aquela doença dela e transferir para mim? Porque ele me odiava tanto?. Eram as perguntas que eu queria que Deus respondesse.

Ao chegar, a casa da tia Nida estava cheia de gente, eu não queria ver ninguém, só o Max, queria que o abraçar e ouvir ele dizer que ficaria tudo bem, mesmo sabendo que não ficaria, que aquele buraco que se abriu naquela tarde nunca se fecharia. Ao chegar eu abracei o Max e choramos juntos, logo ele parou e começou a fala coisas que pra mim não faziam sentido como “ela está melhor”, “vamos ficar bem”.. Ela não podia estar bem sem nós, e como ficaríamos bem sem ela?

Tudo que eu via me fazia chorar, as pessoas, os objetos... Eu queria dormir, tentei, um sono conturbado, cheio de pesadelos, eu queria acordar e ver que tudo não tinha passado de um pesadelo, mas não era, desisti de dormir. Ouvi o pastor dizer que o corpo tinha chegado, que estava muito diferente e era melhor deixar o caixão fechado, tremi. Pedi para ver se era realmente necessário, eu sabia que ela não iria querer seu caixão fechado. Quando vi aquele corpo deitado, frio, não conseguia enxergar minha mãe, sempre tão sorridente e falante... O Marcos estava sobre o corpo, chorando, falando baixo, acho que desabafando, assim que me viu me abraçou e falou algo, mas naquele momento eu não conseguia ouvir nada a não ser o buraco no meu peito se abrindo mais e mais... Sentei na calçada e vi muita gente chegar, pessoas conhecidas, pessoas desconhecidas que sempre vinham me cumprimentar, lembro da dor no buraco do peito que parecia não ter fim.

Muita gente entrava e saia, e eu me lembrava de uma conversa que tínhamos tido antes mesmo dessa doença maldita acontecer... Ela brincava que se o velório dela não desse muita gente, era para pagarmos gente para ir, eu disse que pagaria, só não pagaria para chorarem, ela ria e eu ria também. Mas sabíamos que ela era uma pessoa querida e que todos iriam ao seu velório, só não lotou mais porque muita gente não ficou sabendo...

Confesso que a dor era tanta que eu não consegui ficar para o enterro... Mas se naquele dia doía, hoje eu nem consigo explicar, a dor piorou muito, o buraco no peito só se abriu mais e mais, os primeiros dias foram terríveis, os sonhos, a sensação de impotência por não poder fazer nada para trazê-la de volta... Os sonhos que eram sempre parecidos...

Hoje eu já entendo muita coisas, outras talvez eu nunca vá entender, o buraco no peito continua aqui, ardendo, queimando e cada vez maior, esse não vai cicatrizar... Entendo que o Max não foi um egoísta que nem eu, eu só pensava e ainda penso só na minha dor, ele sempre escondeu sua dor, assim como o Marcos, eles sofrem calados, sozinhos, com medo de fazer os outros sofrerem, eu estou tentando mudar, juro, vou aprender a guardar minha dor para mim.

Uma coisa que aprendi é que podemos usar tudo isso para aprender com a dor, eu aprendi a valorizar cada momento que eu passo com a minha família, com meus sobrinhos... Pode parecer idiota mas, eu me lembro da ultima refeição e ultima noite da minha mãe em casa, das suas ultimas palavras e últimos pedidos, eu não aceito ainda que ela não está aqui, queria tanto pedir conselhos para ela... Ou pelo menos a abraçar e dizer que eu a amo, mas não dá mais tempo, ela já se foi.

segunda-feira, 11 de julho de 2011

Identificação

Olá, meu nome é Lilian Andrade, tenho 18 anos, moro em Formosa, no estado de Goiás.
Sou a filha mais nova de 4 irmãos, como a diferença de idade entre mim e a minha irmã mais nova é de dez anos, sempre fui muito apegada a minha mãe, meu pai era caminhoneiro até uns 2 anos atrás quando se aposentou por problemas de coração. Em abril de 2004 minha irmã teve sua primeira filha, mas ela era muito sem juízo, então eu e minha mãe resolvemos que a Milianny iria morar conosco, a partir daí seriamos nós três. Eramos companheiras, compreendíamos uma a outra só com o olhar, digo no passado, pois minha mãe veio a falecer dia 13 de fevereiro de 2011, vítima de uma Leucemia Mieloide Aguda. Definitivamente aquele domingo foi o pior dia da minha vida... Mal sabia eu que a dor daquele domingo iria piorar mais ainda.... Mas isso já é assunto para outro post.